Ilustração | Daniel Kondo
Eu queria ter avisado antes, mas não tenho o seu email – e quando escrevi a última coluna ainda não tinha esta informação. Que horas são agora? Xi, acho que dançou. Lamento ser a pessoa a trazer essa notícia: você provavelmente perdeu o show do ano.
Quer dizer: de repente ainda dá tempo. Tem um Sesc aí perto? Descubra se ainda resta ingresso para alguma sessão de “Totatiando”, com Zélia Duncan, no Sesc Belenzinho. Boa sorte.
O quê? Eu falei “show”? Desculpe, o termo é inadequado. “Totatiando” está mais para teatro. Mas não é bem teatro. Se você me pedisse para marcar com um xis: Zélia ( ) canta ( ) encena ( ) dramatiza as canções de Luiz Tatit, eu não saberia o que cravar. Talvez pedisse uma alternativa extra: (x) todas as anteriores.
A dificuldade de classificar o espetáculo de Zélia Duncan tem tudo a ver com a dificuldade de classificar o estilo de Luiz Tatit (se você está há pouco tempo no planeta, googla lá: grupo Rumo). Meio cantada, meio falada, uma canção de Tatit é meio música, meio monólogo. Lá pelo quinto verso emerge um personagem perfeitamente delineado – ou então uma complexa questão existencial que até o minuto anterior ainda não tinha passado pela sua cabeça.
Pois muito bem. Tudo o que já era redondinho com o Rumo, com a Ná Ozetti, com a própria Zélia de repente adquire uma nova dimensão no palco de “Totatiando”. Ao pé da letra: as canções se tornam tridimensionais – ganham profundidade, corpo, temperatura, textura e consistência. É como se Zélia Duncan e a diretora Regina Braga inventassem o equivalente teatral do clip.
As catorze canções se sucedem sem que nenhum truque cênico se repita – e sem que você sinta falta de mais alguém para acompanhar a dupla de músicos que compõe a banda minimalista.
A impressão de ter assistido a algo extraordinário só se reforçou quando cheguei em casa e entrei no site de Zélia Duncan. O áudio de fundo é a canção “Felicidade”, do repertório de “Totatiando”. A mesma voz, o mesmo arranjo. Mas senti falta do que vi no show.
O quê? Eu falei “show”, de novo? Como substantivo, talvez seja inadequado. Mas como adjetivo é perfeito.
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